terça-feira, 28 de dezembro de 2021

 ROMANÉE-CONTI O VINHO DOS RICOS E DOS CORRUPTOS

O Romanée-Conti é o vinho mais cobiçado do mundo, símbolo
de status, riqueza, poder e manifesta ostentação. Muitos séculos de história alicerçam essa condição. No ano 1131, o Duque de Borgonha cedeu suas terras ao Mosteiro de Saint-Vivant.
Em 1790, o já famoso vinhedo foi vendido a Louis-François de Bourbon, príncipe de Conti que disputou a compra com Madame Pompadour. O príncipe destinava toda a produção para seu consumo pessoal (e dos amigos, claro). O príncipe com a cara cheia de vinho devia aprontar, tanto que foi preso durante a Revolução Francesa.
A Denominação Romanée-Conti data de 1794. E a família Villaine detém a propriedade do terroir desde 1911.
Eça de Queirós chegou a dizer que por causa deste vinho um filho mataria o próprio pai.
Um documento histórico da época do terror da Revolução francesa refere-se ao vinho como a “um bálsamo para os idosos, os frágeis e os deficientes, devolve a vida aos moribundos”.
O vinho desde os tempos bíblicos sempre foi usado como medicamento. O bom samaritano cuidou do seu próximo que fora assaltado e espancado com vinho e azeite.
Já se escreveu sobre o Romanée-Conti como “uma mão de ferro em luva de veludo”, por aliar estrutura e maciez. Robert Parker, um crítico de vinho notório por sua análise fria e precisa percebeu no vinho “aromas celestiais e surreais”.
Costuma-se dividir os enófilos, os amantes do vinho, em dois grupos: os que
provaram o Romanée-Conti e os que morrerão sem sentir-lhe o bouquet. O atual dono do terroir, Albert de Villaine tem uma idiossincrasia, só atende quem gosta de vinho. Deixou
de receber Giscard d’Estaing porque ele não gostava de vinhos. Não recebeu também o presidente do Cazaquistão pelo mesmo motivo, embora se tratasse de um homem muito rico.
E disse que receberia o Lula se ele amasse o vinho. Lula todos sabem bebeu um Romanée-Conti, safra 1997, pago por Duda Mendonça para comemorar a vitória na campanha à Presidência da República em 2002. Lula até que achou o vinho gostoso, mas
ele prefere caipirinha. Detalhe, o dono do restaurante emoldurou a garrafa vazia e colocou na parede, mas depois um larápio furtou-a.
Aqui no Brasil monsieur Villaine jantou com Paulo Maluf durante a primeira visita que fez ao nosso país, em 1993. Paulo Maluf simplesmente coleciona Romanée-Conti de diferentes safras. Villaine diante da quantidade e variedade de vinhos do seu “monopólio” na adega de Maluf teria comentado: “Só vi isso em país subdesenvolvido”.
O Brasil com efeito é o décimo consumidor mundial do precioso néctar, consome 80 caixas por ano. E
arrematou de Villaine: “Não é meu estilo”. Moral da história o Romanée-Conti na verdade é um vinho ao qual só tem acesso os ricos e os corruptos (duas faces da mesma moeda).
Albert de Villaine discorda da especulação em torno do Romanée-Conti. Em 1978, uma única garrafa da safra de 1978 foi vendida por 24 mil dólares. Mas o fato é que o precioso vinho já virou investimento.
Uma garrafa de uma boa safra pelo menos quadruplica seu valor em dólares em dez anos. O Romanée-Conti é vendido em caixas de
12 garrafas onde apenas uma delas é o próprio.
Depois da história do Romanée-Conti do Lula, petistas criaram um site chamado “romaneecontiparatodos”. Monsieur Villaine achou graça, mas dizia que: “É impossível fazer Romanée-Conti para todos” (...) “As entre 4 e 6 mil garrafas de cada safra são
disputadas por sheiks, reis e ricos”. É claro que uma mitologia alimenta isso tudo. O crítico de vinhos da revista Gula, Guilherme Rodrigues, diz que “De cada dez safras de Romanée-Conti, uma realmente vale o preço”.
O La Tache (que juntamente com Richebourg, Grands Échézeaux, Échézeaux, Romanée-Saint-Vivant e Le Montrachet)
compõe o “assortiment” (pacote de doze garrafas) às vezes sai melhor que o Romanée-Conti. Um outro crítico de vinhos disse que 50 dólares paga a garrafa de qualquer vinho, acima desse valor a pessoa está pagando pela grife. Também podemos pensar nas coisas enquanto funcionais: uma caneta Bic serve para escrever, um carro para deslocar as pessoas e cargas de um canto para outro. A Ford já teve um carro chamado Mondeo um mesmo carro
que era vendido em todo o mundo.
A divisão das coisas em “classes” geralmente se
baseiam em atribuir-lhes atributos artificiais, uma caneta Mont Blanc de prata por exemplo. Para justificar a sociedade em que ricos e corruptos possam parecer melhor que o
comum dos mortais.

sábado, 29 de agosto de 2020

O VINHO AMARELO FRANCÊS

       Também conhecido por vinho de ouro ou Vin Jaune por causa de sua cor. É um vinho especialíssimo. Sua cor deve-se à oxidação nos barris de carvalho onde ele fica por seis anos e três meses antes de ser engarrafado numa garrafa especial de 620 ml para "compensar" a evaporação pela qual o vinho passou nesse período.            

       Feito a partir da casta Savagnin na região francesa do Jura, Château Chalon, leste da França entre Borgonha e a Suiça. A uva é colhida tardiamente e o vinho guardado em barris de 228 litros Mesmo num barril de carvalho aberto, exposto ao ar, dura séculos. O vinho sofre evaporação mas é protegido por uma camada de levedo chamada de voile.

        O "amarelo" possui acidez alta e zero de dulçor. É um vinho especial e único. Na região é "harmonizado" com um pedaço de queijo Comté, típico da região.

        Sua confecção lembra um pouco o vinho xerez produzido em Jerez na Espanha, tem 14,5% de álcool mas não é fortificado. Segundo o sommelier do blog Sobre vinhos e afins o Vin Jaune (vinho amarelo em francês) tem "intenso aroma de casca de maçã vermelha e fermento de pão. Notas oxidativas de avelãs e amendoas, geleia de damasco, cogumelos e com o tempo mel. Na boca é muito seco com boa acidêz e corpo".



segunda-feira, 17 de junho de 2019

VINHO E MEDICINA

 Vinho e medicina na França 


Adega Histórica dos Hospícios de EstrasburgoDireito de imagemALAMY
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O médico grego Hipócrates, conhecido como o pai da medicina, fez experimentos com vários tipos de vinho para tratar doenças, acreditando que "o vinho é apropriado para a humanidade, tanto para o corpo saudável quanto para o corpo doente". Nos tempos modernos, nós aprendemos que devemos beber com moderação, mas, na França, um país cuja viticultura remonta ao século 5 a.C, "à votre santé" - ou "à sua saúde" - é um brinde que ressoa bem até no século 21.
Para aprender mais sobre a relação  entre vinho e medicina na França, eu visitei uma adega nas entranhas de um hospital medieval em Estrasburgo, cidade localizada, no leste do país. Thibaut Baldinger é o nome do gerente da adega que visitei.


VinhoDireito de imagemGETTY IMAGES
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Desde 1395, o Hospital Civil de Estrasburgo tem uma relação simbiótica com a Adega Histórica dos Hospícios, que fica exatamente embaixo do hospital: um literalmente não existiria sem o outro.  Segundo Baldinger: "Era uma prática comum na França, já que as vinícolas geravam renda para os hospitais e as adegas, que funcionavam como geladeiras enormes, eram os locais perfeitos para manter os vinhos na temperatura certa".

A coisa funcionava assim: Uma garrafa de Châteauneuf-du-Pape, por exemplo, seria a prescrição médica para o inchaço, enquanto uma garrafa do preferido do verão por aqui, Côtes de Provence rosé, era usado para tratar a obesidade.
Colesterol alto? Duas taças de Bergerac. Para herpes, era recomendado que os pacientes tomassem um banho de banheira com o adorável Muscat de Frontignan. Problemas de libido? Seis taças de Saint-Amour transformariam o paciente em um Don Juan na hora - curiosamente, duas jarras desse vinho também eram recomendadas para "problemas femininos".

AdegaDireito de imagemMELISSA BANIGAN/BBC
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"E quanto ao fígado?", perguntei. Baldinger riu: "Talvez alguns tratamentos funcionassem melhor que outros, Melissa. Disse ele".

Apesar dos tratamentos de vinho terem sido encerrados há várias décadas, a adega continua tendo um papel importante na produção de vinho ao continuar mantendo alguns dos melhores vinhos do país em troca apoia financeiramente o hospital. Em 1995, porém, a adega quase foi relegada aos livros de história devido ao que Baldinger chamou de "falta de lucratividade".
No final do século XX, a adega foi forçada a abandonar os barris gigantes de vinho envelhecido depois que uma lei do país - a Loi Évin - foi aprovada em 1991. A lei era rígida com o armazenamento de bebida em porões de estabelecimentos de saúde.

VinhoDireito de imagemMELISSA BANIGAN/BBC
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O antecessor de Thibaut Baldinger, Philippe Junger, tornou-se um verdadeiro defensor da adega ao organizar vinicultores da região, criando a Sociedade de Interesse Agricultor Coletivo - SIAC. O grupo de pressão encontrou formas de convencer parlamentares a manter a adega aberta ao falar de sua importância histórica.

Hoje, a adega produz 140 mil garrafas de Gewürztraminer, Klevener de Heiligenstein, Sylvaner e Riesling por ano, com uvas cultivadas por 26 parceiros diferentes. A adega não faz qualquer tipo de publicidade e tem apenas um site.
"Todo produtor de vinho parceiro dá uma pequena porcentagem de sua produção à histórica loja da adega como aluguel", diz Baldinger. Os lucros da parte da produção da adega são investidos na compra de equipamento médico para o hospital.

AdegaDireito de imagemALAMY
Image captionHoje, a adega produz 140 mil garrafas de vinho por ano


E quanto à história do primeiro vinho produzido pela adega? "Eu te mostro", diz Baldinger, ele puxa uma grande chave-mestre do seu bolso e abre o portão que nos leva ao Vin Blanc d'Alsace (Vinho Branco da Alsácia), que acredita-se ser o mais antigo vinho branco mantido em um barril.
Baldinger explica que esse vinho só foi provado três vezes: a primeira foi em 1576, quando os habitantes de Zurique enviaram uma quantidade enorme de alimentos a Estrasburgo para mostrar que a cidade daria assistência em caso de necessidade.

AdegaDireito de imagemMELISSA BANIGAN/BBC
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 Baldinger diz que Estrasburgo reagiu ao ato de bondade dando uma prova do famoso vinho da cidade aos enviados de Zurique.
A segunda prova aconteceu em 1718, durante a reconstrução do hospital após um incêndio devastador. Com provas do vinho foi comemorado o início da reconstrução do hospital.
A terceira e última vez foi em 1944. Durante a Segunda Guerra Mundial. Após o fim da guerra e pouco depois da libertação de Estrasburgo, o general Leclerc tomou um gole do velho vinho.

AdegaDireito de imagemALAMY
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VinhoDireito de imagemMELISSA BANIGAN/BBC
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E as uvas originais usadas no vinho? "Infelizmente, não sabemos", diz Baldinger. "Houve muita mutação ao longo dos anos, e muita mistura de uvas nas vinícolas".

Felizmente, há vários outros tipos de vinhos vintage para provar. Baldinger abriu uma garrafa de Gewürztraminer e nos deu uma boa quantidade para provar e degustamos com prazer. 
De fato, até 1990, duas taças desse líquido eram usadas para tratar infecções. Ao sair da adega, comprei uma garrafa desse "remédio" da Alsácia para minha família colocar no seu armário de remédios - ou mesa de jantar.

sexta-feira, 27 de junho de 2014

O CLUBE DO ÚLTIMO HOMEM


O CLUBE DO ÚLTIMO HOMEM

    O jornal O GLOBO em parceria com o jornal português PÚBLICO realizaram o evento VINHOS DE PORTUGAL NO RIO. Aconteceu no Palácio de São Clemente, residência oficial do Cônsul de Portugal. Já passou, foi em maio nos dias 23 a 25. Os jornais promotores do evento publicaram um fascículo sobre o evento  anexado ao jornal do dia 25/05/2014. Dessa publicação retirei essa interessante historinha:

O CLUBE DO ÚLTIMO HOMEM

 "No Dicionário Ilustrado do Vinho do Porto, obra única no gênero que o brasileiro Carlos Cabral e o português Manuel Poças Pintão editaram, em 2011, há um verbete que demonstra bem a dimensão universal do Vinho do Porto. Trata-se do  “Clube do último homem”, criado na cidade belga de Gent no século passado. Sessenta senhores belgas fundaram um clube fechado, ao ponto de não poderem ser preenchidas as vagas abertas com morte dos associados tal regra devia-se ao "pacto de morte" que justificava o clube. Em lugar de destaque no clube foi colocada uma garrafa de vinho do Porto que só poderia ser bebida pelo associado sobrevivente a todos os outros e por ocasião do funeral do último companheiro.       Quando só restavam dois sobreviventes, um deles disparou: “E se a bebêssemos agora?”. Era uma proposta indecente de quebra do pacto, mas os dois após alguns segundos de seriedade se fitando olhos nos olhos, abriram um sorriso maroto e beberam a garrafa com inenarrável satisfação, brindando à “felicidade dos seus defuntos amigos”.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

A chaptalização continua na Europa

O lobby dos traficantes de açúcar é muito poderoso e não permitiu que a União Europeia banisse a prática de utilização de açúcar pela indústria do vinho.

Vários produtores top de Bordeaux tomaram a rara medida de adicionar açúcar ao mosto durante a vinificação das uvas da safra de 2013, a fim de elevar os níveis de álcool em seus vinhos - processo conhecido como chaptalização.


"Inicialmente a graduação alcoólica do mosto nos tanques era de 12,25%, e nós chaptalisamos até atingir 13%", disse Thomas Duroux do Château Palmer.

A última vez que isso aconteceu em Bordeaux foi em 1994. Em 2013, fatores climáticos desfavoráveis provocaram uma corrida entre a maturação e o apodrecimento das uvas. Está sendo considerada uma das mais desafiadoras safras das últimas décadas.

A chaptalização da uva pré-fermentada esteve perto de ser proibida pela União Europeia em 2008 como parte da reforma do setor vitivinícola. No final, manteve-se legal, com limites estabelecidos para as diferentes zonas geográficas de vinificação.

Regras oficiais para a safra 2013 de Bordeaux é que o château não pode adicionar mais do que 1,5% (álcool por volume) para os seus vinhos através da chaptalização. Resta aguardar para saber o quanto isso afetará a qualidade do produto final.


Fonte: Revista Decanter, junho de 2014.

domingo, 3 de novembro de 2013

CLUBE DES SOMMELIERS DE MEIA TIGELA


O Clube des Sommeliers é uma invenção dos Supermercados Pão de Açúcar. Desse Clube só conheço o nome. Não sei quantos sommeliers dele fazem parte ou quem são. Só vejo a marca em garrafas de vinho. Se um vinho é recomendado por um coletivo de sommeliers, isso é indicativo de que aquele vinho é bom. E que a gente pode comprar esse vinho sem medo.
Mas isso não é verdade. A marca do Clube des Sommeliers é encontrável em vinhos suave. "Suave" neste caso é um termo enganador. Suave é vinho com açúcar. E vinho desde os tempos bíblicos é uma bebida obtida da fermentação de uvas. Apenas isso. Usar AÇÚCAR DE CANA como ingrediente de vinho é uma forma de adulteração do vinho. Dânio Braga disse no livro que escreveu juntamente com Célio Alzer: "Adicionar açúcar ao vinho é fraude". Dânio Braga é o fundador da ABS -Associação Brasileira de Sommeliers. Meu amigo o enólogo Miguel Ângelo Vicente de Almeida retrucou que "fraude" era quando a lei é desrespeitada. Mas no caso da frase de Dânio e Célio não se trata do aspecto jurídico da coisa, e sim de CORRUPÇÃO DO VINHO COM ELEMENTOS ESTRANHOS.
No que depender da lei os brasileiros estão fritos. Porque a lei que regulamenta a produção de vinhos no país é um monstrengo jurídico, desses que resultam de leis escritas por raposas para serem aplicadas ao galinheiro. Imagine que pela lei brasileira, um vinho espumante tipo BRUT contém açúcar. Para se livrar do açúcar de cana você terá que optar pelo EXTRA BRUT. No caso do vinho "licoroso" (argh, uma droga dessa é vinho?) a lei não impõe um limite, um TETO para a adição de açúcar, mas (pasmem), um PISO. Se o produtor quiser usar 99% de açúcar ele usa.

sábado, 7 de setembro de 2013

VINHO ABSTRATO

          Sabendo que o perfume Chanel Nº 5 é um perfume "abstrato" que mistura 80 fragrâncias diferentes. Imaginei a possibilidade de se produzir um vinho "abstrato" com a mistura de dezenas de castas diferentes. Perguntei ao meu enólogo favorito Miguel Ângelo Vicente de Almeida e veja sua resposta:
       Sobre o vinho abstrato obtido da fermentação de dezenas de castas ou do blend de dezenas de vinhos de castas diferentes, todo o vinho é abstrato porque a condição humana que o avalia é abstrata, resulta de uma análise sensorial. Mesmo de uma só casta o vinho é abstrato, é de cada um ou por cada um avaliado de um jeito diferente, nós sempre nos transportamos para o vinho e nele nos encontramos, se tivermos bem nesse dia vamos encontrar só coisas boas, se estivermos mal só vamos encontrar coisas más. O vinho é abstrato, mas nele não deve existir nunca o deslumbre, estilo Romanée-Conti.